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terça-feira, 17 de agosto de 2010

EDUCAÇÃO

SURPREENDENTE REVELAÇÃO

(Maria Luciene)

Naquela tarde, tão logo a professora se preparava para entrar na sala de aula, sigilosamente, sem que a turma percebesse, fora advertida por um dos alunos considerados mais quietos e reservados da classe:

- Professora, a sua cadeira está suja.-continuou:-  alguém misturou água, cola e ponta de lápis para que a senhora, ao se sentar, sujasse a roupa...

- Obrigada pela advertência!- agradeceu amavelmente a professora, já entrando e cumprimentando naturalmente a turma, que obviamente aguardava o esperado momento em que a professora se sentasse para fazer a chamada.Momento esse que, ao contrário dos outros dias, parecia uma eternidade.
Já com os objetos depositados sobre a mesa, após organizar a sala, conferir o mapeamento e exigir a postura correta de cada aluno,  contínuo ritual, a professora, de temperamento austero, após pedir silêncio, finalmente se pronunciou:

- Pessoal, hoje preparei uma aula diferente e do interesse de todos: falaremos sobre princípios básicos de educação, respeito , postura-ética, cidadania...

O suspense era geral.

Introduzida a fala, passados alguns instantes, apesar da repentina improvisação da  aula,  a professora se sentia tão à vontade em enfatizar os temas propostos que a consistência da sua fala  despertava total atenção e interesse da turma , que praticamente se mantinha imóvel prestando o máximo da atenção em tudo o que ouvia. Deixando a imparcialidade, para surpresa geral de toda a turma que até aquele momento deveria estar  achando  uma grande coincidência o direcionamento daquela aula justo naquela tarde em que todos continuavam a aguardar o momento tão esperado,  a professora comentou naturalmente  a armadilha preparada para ela , dizendo conhecer bem a fase juvenil e a força que até os adultos  adquirem quando estão inseridos em turma, a ponto de se revelarem o oposto do que realmente são.O silêncio fora geral.Todos se mantinham imóveis, com os olhos fixos na professora, como a dizer: - não foi eu... Gentilmente a professora convidou o  autor da proeza a se manifestar, não necessariamente para pedir-lhe desculpas, uma vez lhe sendo concedida a oportunidade de poder revelar à turma a grandeza do seu caráter ao assumir a responsabilidade pelo ato praticado.Como ninguém se manifestou a professora deu sequência à sua fala  como se nem a houvesse interrompido. Aproveitou o tema da aula para uma conscientização conjunta sobre a importância do papel da família na educação dos filhos, concluindo que  dia a dia essa carga de responsabilidade ia sendo transferida unicamente para a escola, que deixou de educar para simplesmente disciplinar.

O sinal bateu junto à última fala da professora, que disse esperar ter sido produtiva a sua aula. Dirigindo-se à mesa, pegou o material, gentilmente se despediu da turma, deixando a sala após ter dito que na aula seguinte aprenderiam sobre crônica.

Para sua surpresa, o mesmo aluno que a advertira sobre a travessura, quis acompanhá-la na saída da sala .

Após alguns passos pelo estreito corredor, já tomado por alunos a aguardarem a chegada de seus mestres, ele, timidamente se pronunciou:

- Professora...

A professora, imaginando que o aluno iria finalmente revelar quem teria sido o autor da proeza, completou com o seu jeito amável, porém austero:

-Para mim, o assunto está encerrado. Obrigada pelo alerta...

O aluno insistiu, caminhando rápido para acompanhar a professora que não aceitava o aluno entrar em sala atrasado mas também não se permitia atrasar:

-Professora...

A professora parou rapidamente para ouvi-lo e encerrar de vez aquele assunto:

Cabisbaixo e bastante constrangido, o aluno finalmente conseguiu se livrar do peso que provavelmente tanto o incomodara durante toda a aula:

- A senhora me desculpe...Foi eu quem colocou toda aquela sujeira em sua cadeira...

{...}

Na aula do dia seguinte, após o ritual de todos os dias seguido da chamada, sem nenhuma anotação em mãos, a professora se virou para o quadro, passou toda a definição da estrutura de uma crônica e, após explicar a matéria, novamente se virou para o quadro dando início à produção de um texto em crônica, ouvindo apenas os sorrisos e os cochichos vindos do fundo e praticamente de toda a sala, por identificarem naquela produção todo o relato do episódio ocorrido na aula anterior, cuja identidade do autor da proeza não fora revelada.

( Maria Luciene - julho/2009)