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quarta-feira, 12 de janeiro de 2011

Literatura - livros exigidos pela Fuvest e Unicamp - 2011

“Antologia Poética”, as três fases de Vinicius de Moraes


Livro com poemas selecionados pelo próprio autor mostra a evolução da obra do “poetinha”


Marina Morena Costa, iG São Paulo

Para mergulhar na “Antologia Poética” de Vinicius de Moraes, é preciso ler com bastante atenção o texto que abre o livro, escrito pelo próprio autor em 1949. Nesta apresentação, Vinicius faz uma advertência e explica a construção da antologia, organizada por ele. O poeta faz uma autoapreciação crítica de sua obra, suas fases e seu desenvolvimento

Vinicius de Moraes, o poetinha

O “poetinha”, como Vinicius ficou conhecido, divide a antologia em três partes, que seriam as fases de sua obra. A primeira parte é mística e religiosa, a segunda, uma fase de transição, e a terceira parte do livro, de tendência esquerdista, com temas como a valoração do trabalho humano e os preconceitos de classe e de meio. Esta terceira parte da “Antologia” seria a segunda fase da obra de Vinicius de Moraes, aquela que ele vê como definitiva.

“Grande parte da crítica segue o modelo e a divisão em fases proposta pelo poeta. Mesmo que a crítica discorde não é possível desconsiderar a leitura desta introdução. Não se trata de uma verdade absoluta, por ser a opinião do autor, mas basicamente é uma visão compartilhada por muitos”, avalia Eucanaã de Nazareno Ferraz, poeta e professor de Literatura Brasileira da Universidade Federal do Rio de Janeiro (UFRJ).

Durante a leitura é interessante notar que há textos que se comunicam. Ferraz aponta que na última fase há um desejo da pureza da primeira fase. “Vinicius ama o amor quando ele não se realiza. A realização amorosa é um problema. É como se ele guardasse um resquício daquele período inicial que sugeria que o verdadeiro amor é um amor divino, do homem para com Deus”, explica o professor e pesquisador de poesia moderna e contemporânea.

Ferraz aconselha uma leitura atenta à comunicação entre as fases da obra de Vinicius. É importante descobrir o que os poemas da fase intermediária têm da primeira e o que eles anunciam da segunda. “Os poemas transitam e se deixam atravessar por vocabulários e temas das duas fases. Observar detalhadamente essa fase de transição é muito importante e prazeroso”, ressalta.

Paciência

Aos leitores jovens, Ferraz recomenda paciência e um dicionário ao lado. “Na poesia, uma palavra é o universo inteiro. É bom olhar no dicionário os significados daquela palavra, porque ela pode ser a chave para a compreensão.” O pesquisador avisa que não se pode fazer uma leitura apressada, é preciso ler muitas vezes o poema, perceber o ritmo, “ir descamando-o aos pouquinhos”.

Mergulhar na obra de um poeta é como conhecer uma pessoa. Exige tempo, paciência e dedicação. “O leitor tem se tornado impaciente. Se ele fica dois minutos em uma página de internet é muito. Para o impaciente, a poesia é mais difícil, mas ao mesmo tempo ela tem muito a dar. E Vinicius tem muito a dar. Ele é engraçado, fala de amor. É uma ótima porta de entrada para este universo.”


“Memórias de um Sargento de Milícias”, uma crônica do Rio

Esquetes de Manuel Antônio de Almeida retratam com humor e sarcasmo a vida carioca no começo do século 19

Com ironia, sarcasmo e bom humor, “Memórias de um Sargento de Milícias”, de Manuel Antônio de Almeida, conta as peripécias de Leonardo, o sargento do título, na cidade do Rio de Janeiro do começo do século 19. Originalmente publicado aos domingos no jornal “Correio Mercantil”, entre os anos 1852 e 1853, o livro tem muito a ver com o formato da publicação.

As “Memórias” eram publicadas em uma pacotilha, a versão do Correio Mercantil que circulava aos domingos. Mais leve e com um caráter de entretenimento, a pacotilha comentava comicamente os fatos do Rio de Janeiro então contemporâneos, trazia recados para personalidades, políticos e pessoas públicas, sempre com uma boa dose de humor.

“As ‘Memórias’ ecoam os comentários, as pílulas que eram publicadas na pacotilha”, destaca Mamede Mustafa, professor doutor da Universidade de São Paulo (USP) e autor da tese “Sob o Império da Letra: Imprensa e Política no Tempo das ‘Memórias de um Sargento de Milícias’”.

Apesar de também terem sido escritas no Romantismo, as “Memórias” são bem distintas dos romances de José de Alencar, escritor contemporâneo a Almeida. “O gênero é diferente, mais cômico e documentário. As ‘Memórias’ e os textos da pacotilha eram praticamente satíricos. O cômico apenas provoca, mas o satírico agride”, explica Mustafa. “Em termos de ousadia de linguagem era um humor bastante contundente.”

Durante a leitura, o professor recomenda prestar atenção na falta de um julgamento moral e nas ilegalidades que as personagens comentem. Prevaricação, perjúrio e roubo são algumas das peripécias do sargento. “Leonardo apronta, mas acaba sempre sendo perdoado”, aponta Mustafa.

‘Um brasileiro’

Publicado em livro em 1854 (primeiro volume) e 1855 (segundo volume), “Memórias de um Sargento de Milícias” tem estrutura de folhetim, capítulos autônomos, curtos e histórias com começo, meio e fim. No jornal, as aventuras saíram sem assinatura e na primeira edição em livro, o texto ganhou a autoria de “Um Brasileiro”.

Para Mustafa, há várias hipóteses para explicar a omissão da autoria de Almeida. “Provavelmente, no ambiente letrado da corte, que era pequeno, tudo mundo sabia quem era o autor das Memórias. Pode ser também que ele tenha optado por não assinar, por não considerar o texto bom. Ou talvez não interessasse assinar por motivos políticos”, elenca o professor e organizador da edição da obra publicada pela Editora Ateliê. Mustafa lembra também que na época não era raro escritores publicarem texto sem autoria ou usarem pseudônimos.