(Maria Luciene)
Abençoada pela dádiva de ter nascido no dia de Santo Antônio, 13 de junho, minha modesta infância deixou-me saudosíssimas recordações. Era com muito empenho que minha família se dedicava, todo ano, às comemorações juninas. Eram dias de preparativos até chegar o momento tão esperado: a enorme fogueira estilizada em frente à casa... o bolo decorado com nervurinhas cor-de-rosa e chumbinhos prateados, feito com todo carinho pela vizinha, dona Dica... O quintal todo enfeitado com bandeirolas coloridas... canjica, quentão, batidinhas de vários sabores; especialidade das minhas irmãs mais velhas... pipoca, a batata-doce assada na brasa, as simpatias das moças solteiras ao santo casamenteiro... quem seria o corajoso a atravessar , descalço, as brasas deixadas pela fogueira...
Em uma dessas comemorações houve até o casamento caipira onde minha querida irmãzinha, Maria de Fátima, fora a noiva. Que noiva linda! Como era maravilhoso sentir-me amada saber que eu tinha uma família! Mais encantador ainda era vê-la unida e feliz!
Dentre todas essas saudosas recordações, durante a festa, a expressão suave envolta ao olhar terno de minha mãe, como que a me perguntar:
“- Você está feliz, minha filha?”
Hoje, novamente apunhalada pela dor de mais esta irreparável perda familiar vejo como minha mãe e minha irmã eram idênticas! Tanto na ternura, meiguice e expressiva comunicação através do olhar, quanto no excesso de zelo e cuidados dispensados a mim, o que faz aumentar ainda mais em meu coração a dupla dor da saudade, associada à incerteza do amanhã. Agora, mais que nunca necessito me apegar a todos os ensinamentos deixados por essas duas grandes mestras, visando um imediato fortalecimento espiritual. Ensinamentos esses, jamais ignorados. Mais uma vez, a vida precisa continuar e certifico-me de que atrás de mim há muitas pessoas necessitando dos resultados do meu trabalho, embora acredite ser curta a missão que terei pela frente nesta gleba terrestre. Sinto e pressinto que minha irmã jamais haveria de faltar-me com a sua palavra, ainda que em sonho.
Longe de imaginar os sinuosos percursos que a estrada da vida reservaria a mim e a toda a minha família, hoje posso dizer que, embora não me desse conta na época, eu fui uma criança feliz. Jamais trocaria a estabilidade do passado, com todas as suas dificuldades, pela incerteza do presente. Minha mãe, minhas irmãs e eu éramos uma família unida pelo amor, pela dor, pela religiosidade, pelo respeito ao próximo e pela aceitação das leis divinas.
Sinto saudades até daqueles chumbinhos prateados usados para decorar os bolos de aniversário da época, chumbinhos esses que ,de tão duros que eram, tanto deveriam comprometer a arcada dentária das crianças.
(Extraído da obra "A Pureza De Um Anjo Muito Especial "- Luciene Maria - 2008)