No dia da Educação, especialistas apontam as principais qualidades de um professor
28 DE ABRIL - DIA INTERNACIONAL DA EDUCAÇÃO
Diante da lousa, com a autoridade de
quem detém o saber, o professor discursa. Em silêncio quase sepulcral,
os alunos escutam. Não há brecha para questionamentos nem discussões.
Corriqueira algumas décadas atrás, a cena descrita já não existe mais.
Ou, se existe, está com os dias contados — assim como a figura daquele
velho educador.
Com o século 21, não por acaso batizado
de "século do conhecimento", nasce um novo mestre. Com o intuito de
valorizá-los, o movimento Todos Pela Educação acaba de lançar uma
campanha de mobilização, que a partir desta quinta-feira — Dia da
Educação — ganha destaque na mídia nacional. Com o slogan "Um bom
professor, um bom começo", a intenção é reforçar a importância desses
homens e mulheres e pressionar por melhorias.
— O professor tem uma posição
estratégica no século 21. Só que ele também precisa ser valorizado, e
isso inclui salários iniciais atraentes, plano de carreira e melhores
condições de trabalho. Sem isso, não basta ter brilho nos olhos e, como a
gente diz aqui no Nordeste, fogo nas ventas — diz Mozart Neves Ramos,
professor da Universidade Federal de Pernambuco e conselheiro do Todos
pela Educação.
Mais do que simples transmissor de
conteúdo, esse novo profissional atua como um guia. Em meio à avalanche
de informações despejada a cada segundo sobre crianças e adolescentes, é
ele quem indica o caminho. Trata-se de um tutor, que dialoga e provoca.
Tem paixão pelo que faz, segue estudando, preocupa-se em falar a mesma
língua dos pupilos e nem de longe é um analfabeto digital.
Nesta reportagem, especialistas apontam as principais qualidades de um bom educador. O professor ideal deve...
1) Gostar do que faz
Mais do que qualquer profissional, quem
opta pelo magistério tem de ter paixão por ensinar e se orgulhar de seu
papel na sociedade. Quanto mais os alunos sentirem essa empatia,
garantem especialistas, mais abertos estarão à aprendizagem e melhor
será o desempenho em sala de aula.
— O bom professor não apenas deve ter
orgulho da profissão, como deve defendê-la com garra. Ele é um otimista,
um sonhador. Tem a utopia de um mundo melhor, sem a ingenuidade da
busca de resultados fáceis e sem se abater frente aos obstáculos —
afirma Francisco Aparecido Cordão, presidente da Câmara de Educação
Básica do Conselho Nacional de Educação (CNE) e diretor-presidente da
Consultoria Educacional Peabiru.
Em contrapartida, reconhecem gestores e
estudiosos, o educador que ama o que faz e se dedica de corpo e alma ao
trabalho também precisa ser valorizado por isso. Melhores salários e
condições de trabalho são considerados fundamentais.
2) Ter uma boa formação
Para cumprir com louvor o seu papel, o
professor ideal também deve ter uma formação sólida e ampla. Esse
processo, segundo a superintendente de Educação e Pesquisa da Fundação
Carlos Chagas, Bernardete Gatti, deve incluir o domínio dos conteúdos da
disciplina escolhida e, em igual peso, o conhecimento das metodologias e
práticas de ensino.
— De nada adianta saber o conteúdo, se o
educador não consegue transmiti-lo aos alunos. A maioria dos cursos não
tem nem 10% de formação pedagógica, e esse é um problema sério, que
precisa ser repensado — alerta Bernardete.
Além de uma boa base, a diretora do
Sindicato dos Professores do Ensino Privado do Rio Grande do Sul
(Sinpro-RS), Cecília Farias, destaca a importância de haver continuidade
nos estudos. Para acompanhar a velocidade das mudanças na sociedade
atual, os mestres precisam se manter atualizados — e, para isso, devem
contar com o apoio dos gestores, públicos ou privados. Além de uma
imposição profissional, esse deve ser um desejo pessoal.
3) Falar a língua dos alunos
Não se trata de adotar as gírias ou se
comunicar como um adolescente, mas de entender o universo da garotada e
planejar aulas que levem em conta esse jeito particular de ver e viver o
mundo de hoje.
— O professor tem de compartilhar o
mesmo universo dos seus alunos e ser um pouco artista diante desse
público. Se ele não usar isso a seu favor, se não falar a mesma língua
deles, corre o risco de se transformar em uma cápsula de sonífero — diz o
consultor educacional do Fronteiras Educação — Diálogos com a Geração
Z, professor Francisco Marshall, da Universidade Federal do Rio Grande
do Sul (UFRGS).
Isso significa, por exemplo, estimular a
interatividade e evitar falar sozinho, sem parar, uma aula inteira.
Significa, também, não subestimar os adolescentes. Foi-se o tempo em que
o mestre era o dono do conhecimento. No passado, ele falava e os
estudantes ouviam em silêncio. Hoje, ele deve estimular o diálogo. Se,
para isso, for possível usar e abusar de recursos audiovisuais, como
projeções de imagens, vídeos e músicas, tanto melhor.
4) Usar as novas tecnologias em aula
O educador do século 21 não pode ser um
analfabeto digital. Ignorar ou repudiar a influência da internet na vida
dos alunos é aprofundar o abismo entre os estudantes e a escola.
— Ao tirar proveito disso, o professor
traz a realidade da criança e do adolescente para a sala de aula. É uma
forma de aproximação e, além disso, uma maneira de apresentar o
conhecimento de um novo jeito — afirma a professora Maria Elizabeth de
Almeida, da Faculdade de Educação da Pontifícia Universidade Católica de
São Paulo (PUC-SP).
Não basta, porém, dominar a tecnologia. É
preciso que o educador saiba aplicá-la. Primeiro, é importante que
navegue nos sites preferidos de seus pupilos e faça parte das redes
sociais para entender sua lógica. Depois, a ideia é que explore o
potencial dessas ferramentas de forma criativa.
Por que continuar restrito ao velho
mapa-mundi se pode usar programas gratuitos como o Google Earth para
mostrar regiões, países e cidades em detalhes? Por que não estimular a
garotada a escrever microcontos no Twitter? As portas que se abrem são
infinitas.
5) Ir além do conteúdo formal
O bom professor, ressaltam
especialistas, deve saber que sua missão profissional não se resume a
repassar o conteúdo da disciplina. Hoje ele deve ser um guia, um tutor. O
velho chavão "ensinar para a vida" continua valendo. Cabe ao mestre,
junto com a família, difundir valores éticos e morais e fazer com que
crianças e adolescentes sejam capazes de fazer reflexões críticas.
Para Maria de Salete Silva, coordenadora
do Programa de Educação do Fundo das Nações Unidas para a Infância
(Unicef) no Brasil, ir além do conteúdo implica usar as experiências
vivenciadas pelos alunos como ponto de partida para discutir assuntos
importantes e transmitir ensinamentos.