Primeira Eucaristia
(Maria Luciene)
Sendo larga a distância de idade entre mim e minhas duas irmãs mais velhas, não sei precisar como fora sua Primeira Eucaristia. Sei apenas que na época era comum as meninas entrarem na igreja, em missa dominical de maior público, vestidas de branco, portando véu e grinalda, como uma noiva. As aulas de catecismo aconteciam aos sábados, no salão paroquial da igreja. Minhas duas irmãs acima de mim foram meritórias de todo esse glamour. Eu, porém, por ser a caçula de uma família de cinco irmãs, e muito protegida por minha mãe, vivia lhes fazendo finta dizendo que o meu vestido seria ainda mais bonito que os seus. Minha mãe, com toda a sua delicadeza, sempre que me assentava em seu colo, conversava comigo sobre a minha entrada no catecismo e a importância da Primeira Eucaristia. Sabia da minha curiosidade por experimentar a Hóstia Sagrada, na minha concepção, bem gelada, o que a levou a me revelar ser a Hóstia Sagrada, representada pelo Corpo e o Sangue de Cristo, feita de farinha de trigo, não sendo, portanto, gelada, conforme pensava. Mesmo assim eu não me continha a aguardar o exato momento de também poder ser contemplada com toda a primazia daquela simbologia para mim, de importância inenarrável.
Como ninguém está isento aos desígnios divinos, próximo a minha entrada no catecismo, minha mãe fora acometida por uma enfermidade que a levou para junto de Deus.
Mesmo assim, diante de toda aquela reviravolta que sucedeu em minha família, não deixei de frequentar às aulas de catecismo. Porém, diferente de tudo o que sonhei, tanto as aulas quanto a minha Primeira Eucaristia foram realizadas pelo grupo escolar. Duas vezes por semana, em horário normal de aula, os alunos do catecismo eram convidados a comparecerem à igreja, que ficava ao lado do grupo, para participarem do catecismo. A solenidade, por mim tão prosperada, aconteceu em uma manhã de sábado, onde todos os alunos deveriam comparecer uniformizados , acompanhados por seus familiares. Ganhei das minhas irmãs mais velhas um uniforme novo. Elas não puderam comparecer ao evento por estarem trabalhando. A vida, mais do que nunca, precisava continuar. Após a cerimônia, retornamos ao grupo escolar onde um enorme bolo nos aguardava sobre a mesa, pouco a pouco sendo servido a cada um de nós, acompanhado por uma lembrancinha, feita em papel cartolina, representada por uma vela, simbolizando o precioso momento, contendo a data da Primeira Eucaristia.
Já adulta, relembrando toda a cena, vendo os colegas receberem abraços carinhosos e cumprimentos das suas mães, a maioria alunos carentes da caixa escolar, para mim era como se desde aquela época o nosso Bom Deus já houvesse decidido me privar até mesmo do direito de sonhar.
Hoje, mais forte e mais amadurecida espiritualmente, reconheço que aquele abraço carinhoso e aconchegante eu também, ainda que invisível, tive o privilégio de receber, pois sei que naquele dia considerado o mais importante e especial da minha vida, a minha querida mãezinha, o tempo todo esteve ali, ao meu lado, transmitindo-me o seu amor e a sua energia, o que me permitiu manter-me firme até o final da cerimônia.
(Fragmento da obra " A Pureza De Um Anjo Muito Especial" Luciene Maria - 2008)