Perdoar um erro é diferente de esquecê-lo
Cauê Muraro, especial para o iG
02/04/2011 0
Especialistas dizem que é fundamental aprender a perdoar para conviver em uma sociedade cheia de conflitos, como a nossa
“O perdão é algo próprio do ser humano. E, por mais que se pense que ele é um tipo de sentimento, temos diversas evidências na ciência de que também faz parte da dimensão biológica. E a dimensão social interfere bastante”, avalia o psicobiólogo Ricardo Monezi, pesquisador da área de medicina comportamental da Unifesp (Universidade Federal de São Paulo).
Foto: Getty Images Ampliar
Para perdoar é preciso entender que todo ser humano comete erros
Se o perdão não acontece verdadeiramente, fica um ressentimento que talvez seja nocivo. Diante da possibilidade da repetição do comportamento reprovável por parte da outra pessoa a quem foi concedido o perdão (por causa de uma traição, por exemplo), existe o risco de que se desencadeie um quadro de ansiedade ou depressão em quem perdoou mas não conseguiu superar o ocorrido. “Daí para doença de dimensão biológica pode ser um pulo”, afirma Ricardo.
O padre Valeriano dos Santos Costa, diretor da faculdade de teologia da PUC-SP (Pontifícia Universidade Católica de São Paulo), considera que a convivência civil está, de alguma forma, condicionada ao ato de perdoar. “Ele estabelece, por natureza, uma abertura entre quem cometeu a falta e quem foi ofendido. Isso constitui uma maneira também de se viver em sociedade. Se isso não existisse, seria um desastre para o processo civilizatório.”
Hoje em dia, a ciência vem demonstrando que as pessoas que geralmente exercitam o sentimento de perdoar têm uma melhor qualidade de vida. E existem indícios na literatura médica mostrando que, ao perdoarmos, temos sensação de bem-estar. Isso poderia ser correlacionado à liberação de substâncias químicas. “É como se você, quando pratica o perdão, recebesse uma recompensa do seu cérebro”, exemplifica Monezi.
Além da biologia
Impossível, no entanto, definir o perdão como algo puramente biológico, prossegue o psicobiólogo. O ponto chave do perdão é de natureza psicológica. Não se trata de alguma coisa que deva ser vivida simplesmente em níveis fisiológicos. “Você não vai conseguir perdoar apenas verbalizando, com palavras como ‘eu te perdoo’. Perdoar é buscar um entendimento de que o erro também faz parte do ser humano. E que você, como um ser humano, poderia ter cometido o mesmo erro”.
Assim, perdoar sem compreender seria uma contradição. E tomar o perdão como sinônimo de esquecimento pode trazer danos. O esquecimento não possibilitaria qualquer aprendizado acerca de ética, de moral ou mesmo de crença. “O perdão é a forma mais eficaz de lidar com ofensas que causam mágoas num relacionamento humano e comunitário”, observa o teólogo Valeriano dos Santos Costa.